Compay Segundo, o primeiro em elegância e simpatia
Zezé Sack e Luís Pimentel
publicado no jornal oPasquim21 - out/nov 2002

"Tenho 95 anos de idade e há 90 não dispenso um puro charuto cubano"

Compay é unanimidade na ilha: músico insuperável, de charme e longevidade insuperáveis. Não dispensa um charuto nem uma namorada. Sempre um puro cubano entre os dedos e uma mulher jovem e bonita por perto, esbanja simpatia. Nos recebeu no elegante Hotel Nacional (que inveja dos exilados brasileiros que ficaram "escondidos" lá!), um dos cartões postais de Havana. Fumou, tomou café, sorriu muito e encheu minha bola quando soube que fazemos aniversários no mesmo dia: "Os homens de 18 de novembro são inteligentes, amantes das crianças e das mulheres". Oba. Grande Compay!

- Gosto muito do Brasil e dos brasileiros. O Brasil se parece com Cuba. Pena que o nosso território seja tão pequeno. Se fosse tão grande quanto o de vocês, também seríamos uma potência.

Acha que somos uma potência?
- Sem dúvida. Nós, aqui, temos muitas dificuldades.

Por exemplo?
- Pouca terra para que o camponês. Mas temos cultura e educação.

E saúde.
- Sim! Mandamos médicos para todos os lugares. Nossa medicina e revolucionária.

Por falar nisto, o que o senhor fazia em 1959, quando da vitória dos revolucionários?
- Trabalhava na fábrica de charutos Monte Cristo, em Havana. Quando Fidel entrou na cidade, todos nós saímos para recebê-lo, em festa.

Vem deste trabalho o seu gosto pelos puros?
- Vem de antes. Fumo charutos há 90 anos. Minha avó fumava e viveu 116 anos.

Como está hoje, aqui, a situação profissional para os artistas cubanos?
- Melhor do que antes. Têm mais oportunidade de trabalho. Há muito turismo, então tem sempre um lugar para o artista cubano mostrar o seu trabalho.

O senhor tem trabalhado muito?
- Sim. Me apresento regularmente aqui no Hotel Nacional, viajo para shows fora e tenho contrato de exclusividade com uma grande gravadora espanhola, que distribui meus discos por todo o mundo.

O que significou, para sua vida e a vida de sua família, o senhor ter ganho o Prêmio Grammy?
- Foi importante. Fui até os Estados Unidos, para receber. Foi muito importante.

Esse prêmio é só medalha e reconhecimento, ou tem dinheiro também?
- Só a nominação e o reconhecimento.

O senhor é um músico reconhecido internacionalmente, sua e mais uns poucos artistas cubanos, é atípica. Mas para os artistas talentosos, mas menos conhecidos?
- Tenho filhos e netos que também são músicos aqui, todos trabalhando. Os jovens também encontram onde trabalhar aqui. Aqui, temos muitos músicos, alguns muito bons.

E músicos antigos, tradicionais, que preservam a trova, são muitos?
- Muitos. Somos o país dos grandes trovadores. Artistas do bolero, do merengue.

O sucesso internacional do filme Buena Vista significou o quê para vocês, cantores e instrumentistas, os artistas da fita?
- Foi importante para todos nós.

Hoje estão todos juntos ou afastados, cada um cuidando de sua vida?
- Cada um pro seu lado, cuidando de suas vidas. Mas somos todos grandes e queridos amigos, muitos são conterrâneos meus, de Santiago.

Acha que ainda podem se juntar, em nova temporada?
- Acho muito difícil.

O que era o Buena Vista?
- O clube de shows e danças, muito popular aqui em Havana. Buena Vista Social Clube, que não existe mais. Ficou o nome. Hoje é nome de um bairro em Havana. O filme é uma homenagem ao clube e aos artistas.

Quando pensa em visitar novamente o Brasil?
- Na hora em que me chamarem. Adoro o Brasil. Gostei de cantar no Canecão.

Continuas muito namorador?
- Sempre.

No momento, estás enamorado?
- Estou solteiro, mas disponível. Acabei um namoro há pouco tempo, pois acabou o prazo, venceu a validade.

Em que ano o senhor nasceu?
- 1907, em Santiago de Cuba. Meu pai era maquinista durante a segunda guerra mundial. Acabou a guerra, meu pai ficou sem trabalho. Tinha oito irmãos, sou o terceiro deles.

Algum outro também artista?
- Todos. Até as mulheres.

Em que ano veio para Havana?
- Em 1934. Eu tocava clarinete na Banda Municipal de Santiago de Cuba. Quando deixei Santiago, minha mãe me deu um beijo e me disse: Siga em frente. A sorte está no pé.

Quantos filhos e netos?
- Filhos, cinco. Netos e bisnetos, perdi a conta.

O que vai acontecer em sua festa de 95 anos, dia 18 de novembro?
- Uma grande festa em Cuba, podem ter certeza.

O senhor é um homem feliz?
- Syyyyyyyyy.... como no?